quarta-feira, 25 de julho de 2012

Guantanamera pra você também!




É tarde da noite! Inverno gostoso. A moça se prepara para dormir. De pantufa e camisola até os pés, ela senta na frente do espelho e penteia os longos cabelos. E escuta a noite, aquele barulho gostoso do grilo, o balançar das folhas das árvores e da água do lago. Um ou outro carro na rua. O cachorro late. É! O cachorro late e estraga a surpresa! Mal o rapaz começa “só quero que você...me aqueça neste inveeeerno”, auuuuu, o tchutchuco da família entoa Roberto Carlos e acorda a rua inteira.

Era para ser uma serenata! Ela adora Roberto. Ele a adora. Ele se arrumou todo. Colocou a calça boca de sino desbotada, a camisa aberta ignorava alguns botões, o medalhão de ouro e os cabelos despenteados faziam do visual um romântico pra ninguém botar defeito. Ah, e o violão. Ele e o violão. Um charme!

Ela escuta a música dele mesmo assim! Até o final. Desce as escadas, abre a porta, segura o cachorro (que escapa! E morde a barra da calça do moço), dá um beijo no rapaz, cheira a rosa champanhe que ele levou no paletó cor salmão e fecha as cortinas daquele inverno.

Um inverno gostoso, numa época em que inverno era inverno e Roberto era Roberto! O rapaz guarda o violão na sacola, coloca no banco detrás do fusca branco, acelera aquele motor rouco, acende o farol baixo e vai embora. E nunca mais volta!

Foi para a Cuba. O homem sincero cantava Guantanamera, guajira Guantanamera, nos campos de Cuba. Trabalhava com a terra. E ela lembrava dele. E ele lembrava dela. Mas ele nunca mais voltou!

Diz a lenda que ela o encontrou em Paris 40 anos depois. Ele continuava com os cabelos longos, mas agora grisalhos. Ela não tinha mais a franja, nem madeixas compridas. Trajava um vestido amarelo, tinha um lenço na cabeça, os óculos escuros escondiam os olhos expressivos. Esperava o marido na frente da universidade, um grande especialista em ciências políticas. Quando o bonitão de calça desbotada passou. Não disse nada. Sorriu! E foi embora mais uma vez. Não se sabe mais dele. Tinha pressa. Talvez continue cantando Guantanamera, guajira Guantanamera, em algum lugar. Talvez continue do mesmo jeito.

Só sei que as borboletas na barriga dela pareciam sofrer uma metamorfose ambulante! Voltou no tempo, viveu tudo de novo. O marido finalizou a palestra, foi até a esposa e emendou com um “Coquilles ou scargot, querida? Está na hora de almoçar”.

E o inverno mais uma vez fecha as cortinas! E a única coisa que ela queria, naquele momento, era que ele, o bonitão, a tomasse nos braços e a aquecesse de novo naquele inverno e depois que tudo mais fosse pro inferno. Só mais uma vez!

NOTA DA CAROL: Não se esqueça de ouvir as músicas para ler o texto. Fica muito mais legal! A música funciona como uma espécie de transporte que leva a pessoa a qualquer lugar. Pelo menos, para mim, isso funciona!

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